terça-feira, 10 de novembro de 2009

I Prêmio de Poesia Popular João Sapateiro

O primeiro (e por enquanto único) prêmio literário que conquistei leva, merecidamente, o nome de um dos maiores poetas populares de Sergipe: João Silva Franco, mais conhecido como João Sapateiro. João adquiriu esse nome devido à atividade de sapateiro, profissão que desempenhou durante muito tempo. O poeta nasceu e viveu boa parte da juventude na cidade de Riachuelo. Na adolescência, teve rápida passagem por Aracaju, mudando-se, logo depois, para o município de Laranjeiras. Antes de ser sapateiro, trabalhou em engenho de açúcar na infância e virou engraxate em sua passagem por Aracaju. Mas foi o município de Laranjeiras que o acolheu até a data de sua morte, com quase 90 anos da idade, no dia 9 de setembro de 2008. Abaixo, o poema, com o qual conquistei o segundo lugar: um martelo agalopado de tom claramente metalinguístico que exalta a beleza e a dificuldade desse gênero de poesia popular, a "pedra no sapato" dos fracos repentistas.

Martelando na peleja

Segundo lugar no Prêmio de Poesia Popular João Sapateiro

Cantador nordestino, num martelo,
sobre assunto qualquer faz improviso.
Para tudo que existe, se preciso,
cria sempre algum verso tão belo.
Quando empunha a viola num duelo
contra algum oponente não fraqueja.
O seu canto é cutelo que verseja
desferindo o cruel mote amolado.
Cantador de martelo agalopado
martelando oponentes na peleja.

Um martelo bem feito é mais que prece
na viola afinada do repente.
Se ajoelha depressa o oponente
quando escuta o martelo que merece,
tão potente que, às vezes, se parece
com trovão no sertão quando troveja,
com serpente no chão quando rasteja,
ou bezerro no berro malcriado.
Cantador de martelo agalopado
martelando oponentes na peleja.

Cantador nordestino noite afora,
carregando a viola, não tem medo,
caminhando sozinho no lajedo,
se brincar, faz tremer até caipora.
Nego d'água até mesmo se descora
quando escuta a cantiga sertaneja
e o saci, assustado, saculeja
com a força do seu palavreado.
Cantador de martelo agalopado
martelando oponentes na peleja.

Se a palavra sozinha é perigosa,
mais cortante que lâmina afiada,
imagine a palavra recitada
num martelo certeiro em mote e glosa.
Some a isso a garganta poderosa,
que em duelo nem mesmo pestaneja,
pois duelo é somente o que deseja,
e teremos, portanto, um arretado
cantador de martelo agalopado
martelando oponentes na peleja.

Wedmo Mangueira

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